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One Fine Morning (2022)

O encantamento no desencanto



Como diretora de Bergman Island, um dos principais filmes da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo do ano passado, Mia Hansen-Løve já havia deixado claro a sua sensibilidade na forma de lidar com seus personagens e as situações corriqueiras que permeiam seus filmes. Mas é em One Fine Morning, exibido na 46º Mostra de SP, que a diretora francesa melhor trabalha suas ideias numa unidade, dando ao cotidiano de seus protagonistas uma beleza única e sincera.


O filme acompanha a vida de Sandra (Léa Seydoux) enquanto ela lida com as dificuldades de encontrar uma casa de repouso para seu pai Georg (Pascal Greggory) e embarca num relacionamento com um homem casado, Clément (Melvil Poupand). Essa sinopse sugere uma narrativa extremamente dramatizada, talvez repleta de reviravoltas, mas Mia Hansen-Løve aposta numa abordagem mais direta que adiciona um peso maior aos acontecimentos banais. Para isso, ela geralmente enquadra a protagonista no centro do plano, de forma a focar em suas reações e, dessa forma, levar o espectador a uma posição de intimidade com o que está em tela. Assim, a complexidade das relações de Sandra sempre se faz presente não pela exposição, mas sim pelas delicadezas da atuação de Seydoux (uma das melhores do ano).


A rejeição de uma dramatização frontal mais óbvia permite que o filme flua de um modo humano e puro, livre de moralismos e, consequentemente, facilmente identificável. Sandra é uma mulher comum, que sofre com a lenta degeneração cognitiva de seu pai; a incerteza de um amor fruto de uma traição; e a criação de uma filha em meio a tantos problemas. Ainda assim, ela continua vivendo sua vida um dia após o outro, e Hansen-Løve filma esse cotidiano sem julgamento nenhum, apenas dando espaço aos sentimentos que afloram em tela com naturalidade. Remete até a algo que Eric Rohmer fazia em seus Contos Morais, abdicando de respostas fixas para deixar que os questionamentos perdurem e cresçam no interior de cada espectador.


A pureza e o naturalismo nos quais o filme se apoia elevam o mundano a um lugar belo e mágico. Essa afirmação em si já é um tanto contraditória, mas traduz bem o poder do cinema de fazer do mundo real um espetáculo. Afinal, não fosse pela delicadeza de Mia Hansen-Løve, essa história poderia passar despercebida, mas, felizmente, seu olhar torna especiais as mais triviais situações.


Nota do crítico:


Para mais textos sobre a 46ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, clique aqui!


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