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La La Land (2016) | Uma Ode aos sonhadores

Com técnica afiada e texto apaixonado, Damien Chazelle dá vida ao filme de seus sonhos — e dos nossos também — em um ápice onde a magia do cinema se faz presente em forma pura



A lógica do ‘sonho americano’ é familiar para muitos amantes do cinema que cresceram assistindo narrativas hollywoodianas. A ideia de que qualquer um pode alcançar seus sonhos com esforço é algo bastante intrínseco em algumas narrativas que muitas vezes são conduzidas com tanta paixão que é quase impossível não se cativar, ainda que algumas problemáticas relevantes que façam esse tipo de história — onde sonhos são conquistados com base no esforço e mérito — possam não ser tão de bom tom. Não é coincidência, portanto, a forma como Damien Chazelle se debruça sobre o cinema clássico para realizar La La Land, seu filme dos sonhos. Utilizando de um olhar que mescla essa estrutura quase cinquentista com o contemporâneo, o diretor torna seu conto sobre ‘tolos sonhadores’ algo mágico sem tirar os pés do chão, encantando e surpreendendo na mesma medida. Tudo, claro, em um dos gêneros mais tradicionais do cinema hollywoodiano: o musical.


A obra, também escrita por Chazelle, foca em dois personagens: Mia (Emma Stone) e Sebastian (Ryan Gosling). Em uma Los Angeles contemporânea, a dupla não se conhece, mas fazem parte do mesmo time de pessoas que vivem na cidade em busca de realizar seus sonhos, cada um em uma forma de arte. Ele sonha em abrir um bar de Jazz, sua paixão. Ela aspira ser atriz de cinema. Os dois não estão onde desejam, mas suas aspirações não podem ser facilmente caladas. Até que o caminho da dupla se cruza — e não da forma mais romântica possível, como se poderia esperar — para dar origem a uma tradicional história de amor. Ou não exatamente, já que o romance é apenas um dos traços de La La Land. A magia, aliás, começa antes mesmo do espectador ser apresentado aos protagonistas, já que a sequência inicial ao som de Another Day on Sun já dita o tom que será adotado pelo restante do filme.



A introdução de La La Land, que desde os títulos iniciais até os finais flerta com uma identidade visual clássica, trata de estabelecer esse tom mágico e inacreditável dos musicais tradicionais. É quase como se Chazelle jogasse a sensação de descrença contra o público — muitos reclamam de musicais por sua natureza “impossível de comprar, irrealista demais” —, pois estabelece esse tipo de magia na primeira metade apenas para subvertê-la posteriormente. Neste aspecto, Another Day of Sun é brilhante como abertura por funcionar quase como uma antítese à sequência final, enquanto o traço “sonhador” do texto de La La Land vem à tona na sequência musical seguinte, com Someone in the Crowd, uma música que literalmente aborda a realização do sonho de Mia: ter seu talento descoberto para se tornar a estrela que aspira a ser. Um sonho que, por envolver-se diretamente com a sétima arte, torna-se um tipo de “licença poética” para todo o traço irrealista assumido por Chazelle — como a sequência do planetário.



É curioso, para não dizer ousado, como Chazelle evita se acomodar no senso de clichê proporcionado pela construção de sua história. Para quem revisita La La Land, percebe nuances bem distintas durante o terço inicial do longa, mas para os que estão experienciando a obra pela primeira vez, podem se surpreender. A obra em si constrói uma dualidade em si mesma, que se apresenta em todos seus aspectos, mas principalmente pela música: a emoção evocada por Audition contrasta diretamente com a já citada Someone in the Crowd. Enquanto esta última aborda o sonho pelo lado mais romântico, em Audition o canto sofrido de Stone vem como se a atriz estivesse esgotando a si mesma. É a exposição de um outro lado dos sonhadores, que não parece ter espaço, em um primeiro momento, para a construção do sonho perfeito do musical hollywoodiano: o de dor, de desesperança, de medo. E isso explode de forma ainda maior por La La Land tratar-se, também, de um romance, já que os dois lados dessa história carregam consigo aspirações próprias.


Assim, a passagem das estações ganha uma função para além do traço poético justamente pela forma como La La Land permite-se amadurecer durante suas duas horas. O contraste de cores — uma das direções de fotografia mais bonitas dos últimos anos — muda a cada estação, e sem nunca abandonar completamente o tom quase onírico, torna-se duramente real pouco a pouco, passando por um momento duramente ‘sóbrio’ para, enfim, culminar em uma sequência que entrega o auge do “final de hollywood”, mas de uma forma diferente do que esperamos. É emocionante, deslumbrante, mas também real demais. E tudo isso se passando em Los Angeles, o lugar ideal para receber aqueles que forem tolos o bastante para ousarem sonhar.


Nota do crítico:


Esse o segundo de um especial de quatro textos sobre os trabalhos de Damien Chazelle, quando disponíveis, você pode acessar os demais textos aqui:



 

Para mais críticas, artigos, listas e outros conteúdos de cinema fique ligado na Cine-Stylo, a coluna de cinema da Singular. Clique na imagem abaixo para ver mais do trabalho do autor:



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